quarta-feira, abril 4
Tristeza e depressão pós-parto
sábado, dezembro 23
quinta-feira, dezembro 7
A opinião da Ana
terça-feira, dezembro 5
E finalmente, a polémica - o aborto
Eu acho que não era capaz de abortar. E digo isto porque nunca o fiz. Mas isto sou eu. O meu primeiro impulso é achar que não seria capaz de o fazer, que não quereria fazê-lo, mas sei perfeitamente que sim, que o faria, se me visse numa situação sem alternativa.
Mas esta questão não pode ser discutida partindo destes pontos de vista pessoais e apaixonados. Temos de ser capazes de nos descentrar do nosso umbiguismo. O que me motiva a mim, na minha situação actual e real, não é o mesmo que motiva o vizinho do lado. Compreendo e sou completamente solidária com as mulheres que abortam. Acho que a lei do nosso país é um exemplo do seu monumental atraso em tantas vertentes. Acho uma vergonha ainda serem julgadas no tribunal mulheres que abortaram.
A questão do aborto para mim é essencial, porque mexe com a nossa qualidade humana, com a essência da vida. E a vida, contrariamente ao que muitos pensam, não começa com um aglomerado de células. A vida humana é muito mais do que isso, muito mais do que um corpo a funcionar. Viver não é o mesmo que sobreviver. Há muito tempo já que a nossa espécie deixou de estar apenas ao serviço da sobrevivência pura e dura. O que nos motiva, o que nos faz sentir estar vivos, o que nos anima e nos dá vida é muito mais do que a simples produção do conjunto das nossas células vivas.
E, acerca disto, relembro novamente as palavras de Coimbra de Matos, que deixei mais abaixo:
Vivemos num mundo ainda muito ligado ao materialismo, ao que é palpável, ao que se vê - o que não se vê é muitas vezes relegado para segundo plano ou mesmo ignorado. Ter trissomia 21 ou sofrer de outra qualquer mal-formação cromossómica é uma razão legalmente aceite para um aborto no nosso país, mas sofrer de falta de amor e desejo dos pais não é. Tavez porque a esfera do sofrimento psíquico não seja visível a olho nú, e as sequelas da alma ainda não sejam encaradas pela comunidade, científica e não científica, com a mesma seriedade que as do corpo. Sabemos que a comunidade científica ligada ao tratamento e acompanhamento destes casos - os psi - há muito tempo que lidam com esta realidade, há muito tempo que a estudam e que lhe reivindicaram um estatuto cientificamente válido, mas a verdade é que essa mesma fatia da comunidade científica ainda não tem força nem poder social e interventivo para, num debate deste tipo, como o é o do aborto, conseguir que a perspectiva unificadora da mente e do corpo seja de facto reconhecida e influencie decisivamente a conceptualização ideológica que rege e determina o poder e a orientação política da sociedade.
Por outras palavras, ainda vivemos na idade média conceptual da dicotomia corpo-mente, em que o primeiro é reconhecidamente o reservatório de todo o sofrimento e mal estar associado à doença e à disfunção. As mal-formações ligadas ao corpo, ao soma, são socialmente reconhecidas como razões válidas para que uma criança não nasça, devido ao sofrimento futuro e à diminuição da qualidade de vida que comportam. Já as mal-formações causadas por estados emocionais e factores afectivos são completamente ignoradas. Não se desejar um filho não é um argumento reconhecido para abortar, é antes encarado como um sinal inequívoco de prevaricação materna, num juízo de valor completamente moralista, como se, pelo facto de se ter relações sexuais, fosse automaticamente obrigatório estar preparada para a maternidade.
Quando a maternidade for uma opção tomada em consciência, talvez tenhamos um mundo melhor. Quando o amor e o respeito pela vida humana forem valores mais altos, talvez o mundo realmente avance. E agora estou a ver uns sorrisinhos irónicos na cara dos que dizem defender a vida opondo-se ao aborto... Sim, é a vida humana que eu defendo! Não, não acho que um conjunto de células se possa chamar de vida humana. E que vida vamos oferecer a esse conjunto de células quando se tornar numa pessoa? É claro que não podemos prever o futuro, mas o facto de não se ser desejado é um factor de risco demasiado relevante. Que, quando conjugado com outros, como a falta de disponibilidade económica, ausência de projectos para o futuro, imaturidade emocional dos pais, isto para dar apenas alguns exemplos, pode ter um resultado explosivo.
E depois acho que os Pró-Vida andam um bocado confundidos das ideias. Porque, ou bem que defendem a vida, e então deveriam defendê-la sempre, ou bem que a não defendem. A vida é um valor demasiado precioso para só se defender às vezes. Será que o filho de uma violação tem menos direito à vida do que outro? Ou um bebé com deficiência cromossómica ou com qualquer tipo de mal-formação? Se é a vida que defendem, e entendendo que a vida começa na concepção, então tenham a coragem de defendê-la em todas as circunstâncias. Sejam coerentes com as vossas ideias.
Mas ainda que eu me identificasse com estes argumentos, o que seria muito difícil, mas tentando fazer esse exercício mental, não entendo como é que se pode ser contra a despenalização. Porque, mesmo que não concordasse com o aborto e o considerasse um acto contra a vida, acho que não seria capaz de fechar os olhos à realidade de milhares de abortos clandestinos, praticados em péssimas condições, que muitas vezes têm como infeliz desfecho a morte de tantas mulheres. O que me confrange mais nas pessoas que são contra a despenalização é a sua hipocrisia e a forma como conseguem ignorar esta realidade. Porque o aborto é uma realidade que mata milhares de mulheres. Mesmo que não concordemos com ele, não o conseguimos impedir. Penalizá-lo é apenas condenar as mulheres a praticá-lo em condições não humanas. Como é que se pode defender a vida de um embrião e fechar os olhos a tantas mortes de vidas de milhares de mulheres?
sexta-feira, novembro 17
Mães sinceras
Mas afinal a vida é um filme ou é o quê?
Não, minhas amigas, até podem ser sempre sinceras mas acho que vai para aí uma grande confusão. A maternidade só é um sonho idílico antes de o ser, ou seja, até ao momento em que nos nasce o primeiro filho. Todas as mães de carne e osso já sabem, há muito tempo, que ser mãe também é uma chatice e que os filhos são insuportáveis e detestáveis tão depressa quanto são adoráveis e amáveis (se calhar até mais vezes), que as putas das noites sem dormir nos arrasam a saúde, a paciência e a juventude, que o nascimento do primeiro filho nos põe a cabeça de pernas para o ar, que estar em casa sozinha a cuidar de uma criança nos deixa à beira da inanição social, que os programas infantis vistos e ouvidos a toda a hora nos chocalham os poucos neurónios que ainda temos sãos. Todas as mães já sabem isto há muito tempo, e se vocês ainda não tinham ouvido tais coisas, é porque têm andado distraídas.
Por outro lado, dizer que "a fórmula ambiciosa de maternidade que a maioria de nós gostaria de exercer é virtualmente incompatível com qualquer forma de trabalho, de vida social - e de vida, como um todo" só é verdade se a dita fórmula for completamente irrealista, perfeccionista e aberrante. Claro que todas as mães têm a mania da perfeição, mas ajustar as expectativas demasiado grandiosas à realidade é um exercício que nos faz crescer. Aceitar os nossos limites e trazer a nossa humanidade para a maternidade é, isso sim, o sinal de que a vida é aquilo que fazemos com ela, o resultado das nossas opções conscientes e coerentes connosco próprios. Ter filhos não pode nunca, quanto a mim, ser considerado algo incompatível com a vida, seja lá porque motivo for.
"Elevamos a criação de filhos a um grau de dificuldade sem precedentes. Até os anos 50, mães não sentiam culpa em deixar o bebê chorar. Iam cuidar da casa, e o bebê que parasse de chorar sozinho. Hoje, isso é inaceitável. As crianças mandam, e isso dificulta tudo." Será que as crianças mandam? Decerto haverá casos que sim. A educação é uma tarefa difícil e uma das maiores dificuldades da nossa época é precisamente a imposição de limites e o exercício da autoridade parental. Se as crianças mandam, é porque os pais deixam. Os pais não se podem demitir da sua tarefa educativa. Muito daquilo que as crianças são e fazem é o reflexo dessa mesma tarefa educativa. E vamos parar com essa treta da culpa! Todos os pais sentem culpa, ao longo da educação dos filhos, e ainda bem! É sinal de que são humanos e de que erram e de que têm noção disso! Ou então é sinal de que têm expectativas demasiado irrealistas, o que aí sim, pode ser um problema. Mas a culpa não faz mal a ninguém, até pode ajudar a desenvolver alguma humildade. Deixar-se dominar por sentimentos de culpa desadequados, de forma a que isso nos impeça de errar saudavelmente, é que não é bom.
Às vezes parece que nos esquecemos que também já fomos filhos, ou melhor, que ainda somos filhos. A relação com os pais durante a infância é um dos pilares mais importantes da pessoa humana. Todos sabemos isso, hoje em dia. Sabemos também que a relação mãe-bebé é de extrema importância para o desenvolvimento da personalidade, e que os primeiros anos de vida, principalmente os primeiros meses, são periodos de desenvolvimento crucial, onde ocorrem etapas importantíssimas que não se repetirão jamais. Sabemos hoje tudo isto, mas nem sempre soubémos. O conhecimento nesta área tem tido um progresso extraordinário. No passado, antes da Revolução Industrial, as mães não criava os seus filhos. As crianças eram entregues a amas de leite e algumas abandonadas em conventos para serem criados por freiras. O panorama hoje é radicalmente diferente, e ainda bem, digo eu, e acho que vocês também. Ainda bem que o conhecimento nesta área é hoje tão vasto. Ainda bem que estamos cada vez mais cientes das necessidades das crianças, bebés e recém-nascidos. Afinal, vivemos numa época em que gritar pelos Direitos das Crianças e insurgir-se contra abusos e maus tratos são palavras de ordem, mas facilmente esquecemos que esses direitos começam nas nossas famílias, nas nossas vidinhas, no nosso dia-a-dia.
Somos todas humanas (as mães), não somos super-mulheres, erramos, tropeçamos, gritamos, sufocamos, às vezes parece que não aguentamos. Isso faz parte da vida de todos nós, mães e não mães, pais e não pais. Mas os nossos erros não podem servir de desculpa para que a negligência parental fique impune e seja socialmente aceite como mais uma faceta desta nossa suposta humanidade. Erramos, sim, mas os erros só são úteis quando nos fazem aprender alguma coisa, que é o mesmo que dizer que estamos conscientes de que errámos. A esta consciência segue-se a culpa. A culpa não é nossa inimiga, não senhor. A culpa faz-nos ser seres humanos mais responsáveis. Porque o somos, e é bom que não o esqueçamos. Responsáveis pelo bem estar dos nossos filhos.
quarta-feira, outubro 25
Temos uma nova colaboradora
Vamos dar-lhe as Boas Vindas?
sábado, outubro 21
E estas crianças... ?
Chama-se Joana, tem 6 anos e todas as manhãs desce à sala de fisioterapia para os exercícios matinais. É uma rotina. E a Joana conhece bem as suas rotinas. Vive numa ala pediátrica de um hospital que a acolheu na noite em que sofreu um acidente de viação. Foi abandonada pelos pais uns dias depois dos médicos lhe diagnosticarem uma incapacidade permanente.
Vive no hospital que a acolheu após o acidente. Os corredores e as salas a que tem acesso são o seu mundo branco. E vai continuar a viver nesse mundo até que lhe seja dada alta da fisioterapia. O destino da Joana está decidido. Irá para uma instituição como tantas outras crianças.
Sabiam que os hospitais são o sitio ELEITO para o abandono de crianças? Não sabiam? Têm ideia da quantidade de crianças que crescem dentro de um hospital? Precisando de cuidados médicos, acabam por ficar um dia após outro.
Sabiam que um sorriso arrancado de uma criança destas é um acto quase impossível? Eu não disse impossível, disse quase impossível.
A proposta que vos deixo é que tirem uma manhã, um fim de semana, peguem em brinquedos dos vossos filhos, roupas que tantas vezes guardamos e já não lhes servem e passem no hospital, nos orfanatos, nas igrejas das vossas áreas de residência. No caminho comprem lápis de cor, canetas de filtro (há a montes nas casas dos 300).
Acreditem. Não é impossível arrancar um sorriso a uma criança destas. Há sorrisos que não se conseguem descrever em palavras. E olhem que o sorriso da Joana existe.
Vamos abrir sorrisos?
- «São meninos tristes, porque não têm o pai e a mãe ao pé deles... » Bruna, 5 anos.
Escrito por Alex, publicado no Grau Zero.
Obrigada pela preciosa contribuição!
sábado, outubro 7
Informação a mais?
Este pediatra contesta a actual prática da intervenção médica: segundo ele, há medicação e intervenção a mais. Vivemos na era da informação, cada vez a ciência avança mais e novas descobertas acerca dos bebés e dos recém nascidos invadem a mente de pais e não-pais. Não querendo contestar a importância da investigação científica, fica a questão: será que o acesso a tanta informação não pode ser mais prejudicial do que se imagina?
quinta-feira, setembro 28
Sobre o parto
Li este livro e fiquei fascinada. De tal maneira que tenho de o partilhar convosco. Não vou encerrar o tema anterior, penso que há espaço para irmos falando de tudo.
Michel Odent traça-nos o percurso histórico de uma técnica cirúrgica que, graças à sua evolução, se tornou numa das formas mais usuais de nascer, no nosso século. É claro que está a falar da cesariana. Segundo ele, estamos neste momento na era das cesarianas, e das cesarianas programadas. Esta mudança revolucionária na forma do nascimento foi possível graças à segurança que hoje em dia a técnica oferece. De facto, somos confrontados com imensos estudos levados a cabo nos últimos anos, que comparam resultados entre os nascimentos por cesariana e por via vaginal, e os resultados são inconclusivos. O que quer dizer que, hoje em dia, e com as técnicas sofisticadas que existem, é impossível garantir que o parto por via vaginal ofereça menos riscos que o parto por cesariana.
Como é que este cenário se tornou possível? Para o autor não há dúvidas nenhumas que estes acontecimentos reflectem o desconhecimento e a ignorância dos técnicos de saúde em relação às verdadeiras necessidades de uma mulher em trabalho de parto. E é o desconhecimento e o não reconhecimento dessas necessidades que aumentam os factores de risco no parto por via vaginal. Esses riscos estão relacionados com o uso de fórceps ou ventosa, consequências para o períneo da prática da episiotomia, e dificuldades na dilatação ou mesmo incapacidade para fazer a diltação, com decorrente hipótese de sofrimento fetal.
Todas as mulheres, como fêmeas da família dos mamíferos, têm a capacidade de dar à luz por si mesmas, e se não houver interferências desnecessárias. Todas as fêmeas dos mamíferos o fazem. O que nos distingue em termos cerebrais, dos outros mamíferos, é a existência do neocortex, aquela parte do cérebro que nos permite pensar, e que sofreu um desenvolvimento extraordinário ao longo da evolução da espécie humana.
Durante o trabalho de parto, a parte mais primitiva do cérebro, composta pelo hipotálamo e pela glândula pituitária, segrega uma série de hormonas necessárias ao processo. Em todas as espécies de mamíferos é assim. A principal hormona envolvida no trabalho de parto é a ocitocina, a hormona do amor, segundo o autor. Esta hormona tem um papel activo na contracção do músculo uterino e no desencadeamento do trabalho de parto, bem como no reflexo de expulsão do fecto, um fenómeno normalmente observável no decorrer do trabalho de parto quando este não sofre interferências intrusivas desnecessárias.
O que se passa com a espécie humana é que a outra parte do cérebro, o neocórtex, aquela parte que, precisamente, nos distingue nos outros mamíferos e nos permite pensar e reflectir de forma única, acaba por interferir neste processo que, de outra forma, ocorreria naturalmente. O que se passa nas práticas dos nossos hospitais de há uns anos a esta parte é precisamente a sobrestimulação do neocórtex. Aliás, esta sobrestimulação vai acontecendo al longo da gravidez de uma forma que se revela mais nefasta do que positiva. Como? Vejamos: a falta de privacidade e o sentir-se observada, a presença de luz forte, a presença de um aparelho de monitorização do batimento cardíaco e da progressão do trabalho de parto, ouvir alguém falar, até a simples presença de um homem!
As necessidades básicas e fisiológicas de uma mulher em trabalho de parto podem, assim, resumir-se a uma frase: "não estimular o neocórtex". Falar com alguém é uma das maneiras de estimular esta parte do cérebro, por isso a mulher em trabalho de parto não precisa de palavras. Precisa essencialmente de se sentir segura, protegida e sentir a companhia de alguém que assuma essa função de protecção (uma figura maternal). Precisa de privacidade e de respeito por essa necessidade fundamental. O sentir-se observada e julgada suscitam ansiedade e estimulam a produção de hormonas da família da adrenalina, que atrasa o trabalho de parto. Precisa de estar num ambiente calmo, tranquilo, com muito pouca estimulação visual e auditiva. Se estas necessidades forem reconhecidas e respeitadas, uma mulher tem capacidade fisiológica para dar à luz sem interferência.
Mas e perguntamos nós: então e o saber que o bebé está bem? Não é essencial? Durante o parto essa é uma das preocupações de todas as mães. No entanto, e segundo este autor, essa necessidade de saber que o bebé está bem já faz parte do clima ansiogénico que se gera à volta do parto e do nascimento. Estamos ansiosas porque o próprio acompanhamento durante a gravidez é um constante bombardear de informação que gera ansiedade. Fazemos baterias de testes umas atrás das outras para saber se está tudo bem. Fazemos exames cada vez mais sofisticados para espreitar o bebé no útero e assegurarmo-nos de que tudo está bem. Isto, ao contrário do que seria de esperar, não nos retira a ansiedade, mas alimenta-a.
Durante muitos séculos, em muitas culturas humanas, os rituais relacionados com o nascimento interferiram de uma forma intrusiva na intimidade da mãe e do bebé recém-nascido, no sentido de separar o bebé da mãe nos momentos após o nascimento. Apesar de já existirem muitos estudos e evidências científicas da importância do contacto precoce entre a mãe e o bebé nestes momentos, é ainda prática corrente na maioria dos hospitais esta separação, invocando para tal toda a espécie de explicações e justificações médico-científicas. Michel Odent relaciona estas práticas com o facto de, para as sociedades de então, ser importante criar indivíduos mais agressivos para assegurar a continuidade da espécie (isto em termos evolutivos). Esta terá sido a realidade de séculos e séculos de história da humanidade, desde os seus primórdios.
A questão que se levanta é: será que isto faz sentido na atualidade? Afinal que sociedade queremos criar? Queremos continuar a ter sociedades guerreiras? Os valores que as sociedades actuais querem incutir nos seus indivíduos são completamente inovadores em relação aos valores do passado: hoje em dia há uma preocupação generalizada com o afecto, com a tolerância, com a paz, com o civismo, com a partilha, com a solidariedade, com a cooperação, com práticas anti-discriminatórias, isto só para dar alguns exemplos. O que as sociedades têm que entender é, acima de tudo, que, mantendo os rituais de nascimento existentes, dificilmente estes valores vingarão.
O aumento da taxa de cesarianas e de cesarianas programadas também traz consequências muito importantes a nível social. Especialmente no segundo caso, em que a mulher não entra em trabalho de parto. Quando o trabalho de parto é espontâneo, dá-se a libertação do cocktail hormonal indispensável para que este decorra naturalmente. Ao contrário, quando a cesariana é programada, a produção hormonal fica comprometida. O que se passa é que os processos de nascimento actuais interferem cada vez mais com esta produção hormonal que se desencadeia durante o trabalho de parto, e isto traz consequências a nível da vinculação e futura relação mãe-bebé, bem como do sucesso da amamentação. É altura de parar e perguntar: que seres humanos queremos criar? É altura de pensar em termos de futuro, a longo-prazo, capacidade que a nossa espécie não domina de forma nenhuma.
Podia estar para aqui a escrever sem parar sobre o livro, pois levanta tantas questões novas e encaradas de uma perspectiva ambiciosa e inovadora, que torna inesgotável qualquer comentário. Recomendo vivamente a sua leitura. E, depois de o ler, não mais olho para os meus partos com os mesmos olhos com que olhava antes. Compreendo agora porque é que, quando o David nasceu, fechava os olhos de forma persistente (e a enfermeira sempre a dizer-me que não se tinha um filho de olhos fechados!). Compreendo porque é que me incomodava que falassem comigo. Compreendo porque foram as mãos do meu marido a acariciarem-me a testa e os cabelos tão importantes. Comprrendo porque é que, apesar de terem sido os dias mais felizes da minha vida, não foram nem de perto nem de longe como eu queria que tivessem sido. E quero compreender mais!
Testemunhos
terça-feira, setembro 26
Ser capaz de soltar as emoções negativas
Os fins de tarde são, normalmente, horas de grande desgaste. E este desgaste faz-se sentir por parte de quem cuida mas também por parte de quem recebe os cuidados. Os bebés choram, gritam, as crianças fazem birras, testam ainda mais a paciência dos adultos, parecem tornar-se deliberadamente desobedientes quando na realidade estão a reciclar a energia que neles se acumulou ao longo do dia: a energia negativa. A mesma que nós, crescidos, engolimos a cada momento em que as coisas não se processam como desejaríamos, seja em relação a que assunto for, mesmo quando aparentemente nem sequer parece ser importante. A tudo isto junte-se a chegada a casa, preparar jantares, banhos, roupas, trabalhos de casa, enfim, um sem-número de tarefas que precisam ser cumpridas e temos uma mistura de pólvora e dinamite frequentemente pronta a disparar por todo o lado.
Saber controlar o que se sente significa estar consciente das reacções que cada situação provoca em nós mesmos, significa ser capaz de admitir que estar zangado é tão natural quanto estar contente, significa ser capaz de falar sobre isso, de fazer cara feia se for preciso. Tudo isto, acho, vai-se conseguindo no crescimento e na aprendizagem que abordaste no texto, que não acaba nunca mas que para começar basta um esforço e uma vontade.
segunda-feira, setembro 25
Nem tudo são rosas!
A conversa sobre Amamentação
Amamentação: a minha experiência
(Esta é uma faceta minha. Acho sempre que existem demasiadas técnicas, ferramentas e publicações sobre assuntos que deveriam ser naturais e tratados com bom-senso. Mas este é outro assunto que aproveito para propor que seja discutido aqui.)
E foi mesmo assim ao princípio. Quando o Henrique nasceu não mamou logo. Estava um pouco mal-disposto, segundo a enfermeira que o levou para lavar. Quando o trouxe, já lavadinho e penteado, ajudou-me no primeiro movimento e lá estava ele a mamar. Como eu sempre pensei, não custou nada e assim foi durante o primeiro mês. Ele mamava quando queria, como queria e era sempre muito despachado. Nunca tive dores, excepto no dia da subida do leite em que não me reconheci ao espelho. Até que comecei a sentir que o peito já não recuperava como antigamente, ele começou a chorar no fim das mamadas e passados alguns dias tinha perdido peso. Desesperei, pensar que o meu filho estava a passar fome era ainda mais insuportável do que pensar que tinha falhado na minha obrigação principal: alimentá-lo. Dei-lhe o primeiro biberão e ele nunca mais pegou na mama. Ainda tirei leite à bomba para lhe dar em cada mamada. Foi muito cansativo e passado um mês acabou. Nessa altura fui bombardeada com informação sobre amamentação. Informação que já existia mas que me passava ao lado. Informação que me fazia sentir incompetente e falhada até que desisti de tentar encontrar explicações para o que aconteceu.
Quando engravidei do João já não tinha tantas certezas sobre a amamentação. Sabia que podia falhar ou sofrer alguns percalços pelo caminho e decidi que todos os dias, todas as mamadas eram uma vitória. De cada vez que ele mamava e ficava satisfeito eu sentia que estava tudo a correr bem, mas sem pensar que queria fazê-lo até ele ter 4, 6, 12 ou 24 meses. Saí da maternidade com o peito gretado e com tantas dores que não aguentava a boca dele no mamilo. Usei bicos de silicone sempre que me doía. E ele mamava imenso, nunca fazia intervalos de mais de 3 horas e às vezes eram de 1 hora. E assim foi mamando e aumentando tanto de peso que o médico e enfermeiras me perguntavam sempre se era só mama. Comecei a trabalhar quando ele tinha 4 meses e ele bebia um biberão de leite de lata por dia (o outro era do meu leite que tirava de madrugada). Com 5 meses foi para a escola e começou a comer uma papa pois recusava-se a beber leite lá. Com 6 meses iniciou as sopas e gostou tanto que já só mamava de manhã e à noite. Aos 8 meses deixou-me, naturalmente, como eu sempre quis.
Estou grávida novamente e sei que vou amamentar. Pelo menos uma vez e enquanto correr bem para mim e para ele. Não há mínimos nem máximos.
Escrito por Liliana (enviado por mail).
Muito obrigada, Liliana, e parabéns pela tua persistência.
domingo, setembro 24
quinta-feira, setembro 21
Sabiam que
Mas deve haver mais para o ano, entre outras acções, penso eu. Era interessante vermos o nome de Portugal nos países envolvidos... era, era...
Fica aqui o link.