sábado, outubro 21

E estas crianças... ?


Não é fácil abrir um sorriso a uma criança que vive num mundo à parte.

Chama-se Joana, tem 6 anos e todas as manhãs desce à sala de fisioterapia para os exercícios matinais. É uma rotina. E a Joana conhece bem as suas rotinas. Vive numa ala pediátrica de um hospital que a acolheu na noite em que sofreu um acidente de viação. Foi abandonada pelos pais uns dias depois dos médicos lhe diagnosticarem uma incapacidade permanente.

Vive no hospital que a acolheu após o acidente. Os corredores e as salas a que tem acesso são o seu mundo branco. E vai continuar a viver nesse mundo até que lhe seja dada alta da fisioterapia. O destino da Joana está decidido. Irá para uma instituição como tantas outras crianças.

Sabiam que os hospitais são o sitio ELEITO para o abandono de crianças? Não sabiam? Têm ideia da quantidade de crianças que crescem dentro de um hospital? Precisando de cuidados médicos, acabam por ficar um dia após outro.

Sabiam que um sorriso arrancado de uma criança destas é um acto quase impossível? Eu não disse impossível, disse quase impossível.

A proposta que vos deixo é que tirem uma manhã, um fim de semana, peguem em brinquedos dos vossos filhos, roupas que tantas vezes guardamos e já não lhes servem e passem no hospital, nos orfanatos, nas igrejas das vossas áreas de residência. No caminho comprem lápis de cor, canetas de filtro (há a montes nas casas dos 300).

Acreditem. Não é impossível arrancar um sorriso a uma criança destas. Há sorrisos que não se conseguem descrever em palavras. E olhem que o sorriso da Joana existe.

Vamos abrir sorrisos?
PASSAR DAS PALAVRAS AOS ACTOS ?

- «São meninos tristes, porque não têm o pai e a mãe ao pé deles... » Bruna, 5 anos.

Escrito por Alex, publicado no Grau Zero.
Obrigada pela preciosa contribuição!

Este texto surgiu no contexto de uma corrente iniciada na blogosfera, sobre as crianças que vivem maus tratos, que são abandonadas, que sofrem horrores, que são agredidas e violentadas todos os dias mesmo debaixo do nosso nariz.
É um tema forte, difícil de abordar, que nos toca profundamente e que mexe com os nossos medos e as nossas expectativas sociais. Um tema que tantas vezes esquecemos, mas que nos incomoda e impressiona quando nos entra pela porta dentro, geralmente pela televisão, ou pelos jornais ou revistas, ou na boca de alguma conversa. E se a sugestão é passar das palavras aos actos, vamos tentar que estas palavras (as aqui trocadas) acabem por semear algo dentro de nós, que motive os actos e as acções.

3 comentários:

Anónimo disse...

(aiaiaiaiai que eu andei desaparecida por aqui e de repente há imenso que ler...! desculpa o abandono, papu! este cantinho teu merece a visita e o contributo de toda a gente!)

é com este lado da vida que eu lido quase todos os dias, sabes? no meu curso aprendo muito sobre doenças mentais, as que vêm nos livros, as que toda a gente estudo e investiga e conhece, aquelas que eu tambem, por estar no curso em que estou, tenho de conhecer e estudar. mas, quando chega a altura de investigar, de pesquisar, é sempre por aqui que eu entro. por esta portinha dos fundos que, apesar de tudo, muita pouca gente conhece: a das crianças (e adolescentes e adultos e idosos) que, mentalmente saudáveis, vêm a vida virada do avesso, moram em locais onde é suposto só se estar de passagem ou nem sequer chegar a estar-se, sobrevivem abandonados e aprendem a lidar com essa sensação dia após dia.

bebés abandonados em hospitais ou à porta de orfanatos e privados do contacto humano que é tão fundamental quanto um biberão de leite, crianças cujos sorrisos são - como dia o texto - quase impossíveis de arrancar, adolescentes que não se preocupam com saidas, roupa, amigos mas sim com trabalho arduo para ajudar a alimentar a familia ou que de tão perdidos andam aos encontrões à vida, enfim... o rol é enorme e são tantos!

há momentos em que os hospitais se enchem de pessoas dispostas a dar um pouco do seu tempo para ajudar, para trazer quentinho a todas estas pessoas. e quando falo em hospitais, falo também em orfanatos, lares... depois, vem uma fase de abandono. as pessoas envolvem-se noutros projectos e a sua vida acaba por comer o tempo que tinham para dar aos outros. e digo isto sem julgar. as coisas são mesmo assim. o que é mesmo preciso é que não se páre, não se fique a lamentar em frente ao televisor ou ao jornal. saia-se de casa e faça-se alguma coisa! 1h por semana, um dia por mês, nas férias, não importa!colabore-se para aumentar os sorrisos esquecidos no fundo do coração de tanta gente!

hei-de escrever-te mais sobre isto

Alex disse...

A crueldade humana está além do entendendimento possível.
Obrigada por teres partilhado o texto Papu, que possamos fazer um pouco entre todos, por algumas crianças. E podemos fazer tanto ... com tão pouco.
Fantástico o teu testemunho Ana.

kikas disse...

Existem tantas crianças abandonadas e tantos pais com vontade de dar carinho a uma criança. Porquê tanta borucracia para a adopção? Porquê tanto tempo de espera para adoptar uma criança? Se o estado/ entidades não pusessem tantos entraves, com certeza que haveria menos crianças em situação de abandono e mesmo em sofrimento. Parabéns pelo blog. Gostei muito.